sábado, 14 de março de 2015

Eu, que Bocage jamais serei...

…imaginando-me enleado por etérea dama!

Falais de estimular o intelecto,
Mas há no mundo, por certo,
Órgão que mais quer ficar erecto
Do que propriamente o cérebro…
P’ra masturbar na língua lusa,
Ganhando silábica tusa,
Ejaculando de forma profusa
Palavras inspiradas numa musa –
Para tal, doutra não necessito,
P’ra que o texto seja escrito,
Que a Língua própria – fique dito! –
Em que, verbalmente, me excito!
Todas as demais situações,
Respeitadas umas tais circunscrições,
Serão devaneios, ilusões,
Serão passageiras atenções…
A pluma, porém, em seu trabalho
Pode confundir-se c’ o caralho,
E o papel, claro, c’ o agasalho
Em que depõe aquele o coalho
Que é garantido que de ele escorra.
Chamai-lhe texto, chamai-lhe esporra,
Tudo isso depende agora
De quem convosco concorra
Nas ditas contendas verbais.
Tempo, não lhe faço perder mais,
Mas quero, contudo, que saibais
Que o que tanto prezais –
A tão preciosa amizade –,
Lhe presto vassalagem, lealdade,
Por ela ergo minha espada
E a quero mui bem estimada
Contra todo, qualquer equívoco!...
Lá nisso, nosso tom é unívoco,
Nosso canto é uníssono,
Vós, todavia, soprano, eu barítono,
Mas comungando a mesma hóstia…
Porém, Senhora, se vos gosta
A Língua bem dita, bem-posta,
Acautelai-vos! Pode dar à costa
Quem possa mal percebê-la,
E se ao serdes bela
Aliais intelecto que se revela,
Pode querer, naturalmente, fodê-la,
Tal como, sabê-lo-eis com certeza,
É próprio da humana natureza,
Que não logra escapar ilesa
Às tentações de cama e mesa!...
P’ra tudo isto, Senhora, vos advirto:
Que podereis deixar hirto
Quem não saiba manter circunscrito
O foder ao texto escrito.
Já quanto a mim, faz-se tarde;
Vou deambular pela cidade,
Cultivando fraternal amizade
Com meus mestres, pois claro, Bocage & Sade!...

El Rey Ninguém
(em estado sadobocágico)

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