domingo, 28 de fevereiro de 2016

Mesmo uma vaca

Pudera ser estória de alguidar e faca,
Esta de me duchar c’ uma vaca,
Mas não! Este vero evento “deluxe”
Aconteceu sob as águas do meu duche.
Ali entrei, despojando-me da roupa,
Ficando em preparos onde vergonha é já pouca;
Ela, entretanto, já lá estava, corpo notório,
Encostado, languidamente, ao rebordo do lavatório.
Ainda agora a visão, só a visão dela me marca.
Não pude resistir. Disse: “És mesmo uma vaca!...”
Ela, ante estas palavras, não tugiu nem mugiu.
Senti então, sobre a pele, mais acutilante o frio,
Tanto que a tomei pela mão, conduzindo-a, deste modo,
Ao duche com água já beijando o rebordo –
Água que então derramámos sobre os nossos corpos,
As bocas desabrochando, quais flores de lótus,
Num frenesim a todos os níveis intenso, crescente,
Uma descoberta feita cada vez mais urgente…
A vaca, em mim, cada vez mais se esfregava:
No meu rosto, no meu peito, nas partes pudibundas,
Deixando-mas, por tal efeito, inflamadas, rubicundas!...
Tomei-a em minhas mãos quantas vezes me aprazia,
E nisto seu corpo bovino mais em mim se derretia.
Quem dela diria ter um corpo assim, tão fogoso,
Possibilitar-me, como tive, genuíno orgasmo espumoso?!...
E nisto nos deleitando, chegara o duche a seu fim.
Ah como sempre desejara ter uma vaca assim…
Faz o que lhe mando, é carinhosa, não tem ciúme;
Quando nos separamos, deixa, ainda assim, seu perfume
Espalhado em cada íntimo recanto da minha pele –
Um eco de loucas primícias de leite e mel…
Por isso, caros amigos, se vaca assim sempre quisestes,
Façam como eu: comprem um sabonete destes!....


El Rey Ninguém
(bovinamente dedicado à higiene íntima)

sábado, 6 de fevereiro de 2016

Múltiplos de 2

Se exprimi-lo não vos ultraja,
Dir-vos-ei que mais que uma gaja
Partilha o leito onde repouso.
É só mais uma, que a mais não ouso,
Que nem nas visões mais alucinogénias
Me imaginei assim, com duas fêmeas,
E ambas, por sinal, de formosura
Equivalente talvez apenas à mesura
Com que me tratam entre lençóis:
Com todo amor, todo zelo, pois,
Me estreitam contra si, nesse aconchego,
Que descanso é de todos o mais ledo
Que, para mim, desde sempre desejara!...

Por vezes, contra a minha se escancara
A boca, dócil boca de qualquer delas –
Assim se ocasionam venturas mais belas
Das que possam em verso algum caber.
Quaisquer palavras estão aquém do prazer
Que as duas, em tais momentos, me infligem:
Caio assim a pique, numa vertigem
Cujo fim, parece, não se vislumbra,
E tudo isto na penumbra
(Ao abrigo de qualquer indiscreto olho)
Do quarto onde com elas me recolho…
Mas o que mor espanto gera
É que, entre as duas, há uma ela
Cuja fortuna a minha espelha,
E é tal que nisto se assemelha:
Lá em seus aveludados lençóis,
Com gajos, pois bem, dorme com dois!
Haja a quem isto cause horror,
Mas, aos pares, segundo consta, é bem melhor –
Cá sempre ouvi, bem alto, proclamá-lo,
Vale p’rá galinha e p’ró galo,
Que não vejo por que se discrimine
Quem viva sob bênção tão sublime!...


Já me disse um bom amigo – o João –
Invejar-me, por tal, até mais não;
E já outro – o bem mais severo Albertino –
Excomungou-me, baptizando-me “libertino”!
Mas se há coisa que não me rala
São as más-línguas de sala,
E é por isso que reforço e reitero
O que vos disse, para mais sendo sincero:
Gajas, pois bem, durmo com duas,
E uma delas, noutras tantas luas,
Com dois gajos, vo-lo garanto, dorme também!

E a razão para que tudo esteja bem,
Entre as paredes do nosso quarto,
É que somos ao todo quatro,
E não seis, como pensastes depois!
Pode que sejam múltiplos de dois,
Mas, contas feitas, disto se trata:
Durmo com quem amo, mais uma gata,
E nesse leito, como vedes, tão lato,
Dorme, além delas, mais um gato!
E assim, contemplai!, já tudo fica conforme:
Durmo com duas, e ela… com dois dorme!

El Rey Ninguém
(prosélito súbito do pluriamor!
Nota: imagem de AJ Caseirão (in "Desenho: Da Legion Love")