quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Quadras Vesgas

Ainda mal raiara o dia
E eu limpara a nocturna baba do lábio,
Eis que um escândalo de oftalmologia
Irrompe pelas colunas do rádio!

Vão prá escolinha e pró colégio
Fazer exames às vistas
E vêm de lá – sortilégio! –
Com carimbo de contrabandistas,

Sob o envilecedor argumento
De que para ali vão, a saber,
Com um só pensamento,
Que é, cito, “vender, vender, vender!...”

E, meus senhores, não se trata só disso:
Consta que, nesse belo bico-de-obra
(Que está a gerar rebuliço,
Pois, parece, vendem a banha da cobra),

Pelo jeito e em vez da oferta
De um par de óculos de sol,
Só falta a venda directa
De lentes estilo garrafa de Sumol!

Ora, que posso eu dizer senão… “discordo”!?
Sou, inclusive, a favor da campanha,
Pois neste país, grosso modo,
Miopia não é decerto coisa estranha

À maior parte da populaça,
E, pior que isso!, não é por este exame
Que a maleita regride e passa;
Isto não é tecnologia do Tio Sam,

Rege-se por diferentes directrizes,
Bem mais dignas de figurar no cardápio
Do festival de Vilar de Perdizes,
Onde um qualquer Mané é Esculápio!


Quer-me parecer que há muito tempo
Que anda míope o nosso Zé:
Só vê o fora, não vê o dentro,
Não vê a realidade como ela é,

Tem, por assim dizer, a visão distorcida
De tanto lha mostrarem desfocada,
E, assim, fazem-no viver uma vida
Que, de vida, pouco tem ou quase nada!

Se tudo isto fosse ao contrário,
Ainda do mal o menos,
Mas miopia tornou-se um fadário
Desde há meia-dúzia de governos,

E agora parece que não há volta a dar
Para, enfim, se resolver este frete,
Pois onde já havia buraco de assombrar,
Só viam, eles, o cu dum alfinete!

E nós, cegos que nem toupeira,
Fomos na cantiga do bandido,
E agora eis-nos aqui, um povo à beira
De, além de vesgo, ficar f… falido!...

El Rey Ninguém
(se já via mal ao perto, agora, 
ao longe, ainda pior...)

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